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Foto do escritorInstituto Português de Relojoaria

JULIENA FILA A PARIS II

Atualizado: 25 de jul. de 2022

Recentemente publicámos um artigo acerca de um impressionante relógio de bolso, com dias da semana em português, adquirido por Sílvio Pereira na Áustria. Após a publicação no nosso site, Cláudia Paiva iniciou uma pesquisa sobre a origem da senhora que cuja miniatura aparece na caixa do relógio, "Juliena". Passado uns dias apresentou-nos o resultado - segundo a sua investigação, a senhora "Juliena Fila" será na verdade: "Juliana Maria Luísa Carolina Sofia de Oyenhausen e Almeida, a terceira filha da quarta Marquesa de Alorna. "As suas qualidades de mulher ilustrada e cosmopolita, foram conhecidas e apreciadas por grandes figuras da Europa de então com quem teve a oportunidade de privar: a rainha Vitória de Inglaterra, o imperador da Alemanha, e os Czares Nicolau I e Alexandre II da Rússia." Estas são as palavras de José Norton, no seu livro "Juliana Condessa Stroganoff".


Miniatura de Jean-Urbain Guérin (1760-1836). Pertence à colecção da Fundação das Casas de Fronteira e Alorna.
Miniatura de Jean-Urbain Guérin (1760-1836). Pertence à colecção da Fundação das Casas de Fronteira e Alorna.

Relógio de Sílvio Pereira com miniatura de Juliana

Comparação entre pintura de Juliana e miniatura do relógio de Sílvio Pereira

A GRANDE INVESTIGAÇÃO DE CLÁUDIA PAIVA


Apresentamos aqui a investigação de Cláudia Paiva que termina com uma hipótese acerca do possível primeiro dono do relógio “Juliena”.

"Juliana Luísa Maria de Almeida e Oyenhausen nasceu a 20 de Agosto de 1782 em Viena e era a terceira filha do conde Karl Peter Maria Joseph August von Oyenhausen-Gravenburg e de Leonor de Almeida Portugal de Lorena e Lencastre – Quarta Marquesa de Alorna. O seu pai foi embaixador português na corte da imperatriz Maria Teresa da Austrália, e a sua mãe poetisa e famosamente conhecida no seu tempo e no mundo literário por "Alcipe".

A história da vida de Juliana é surpreendente — marcada pela tristeza de um casamento infeliz e pela difamação e solidão do exílio a que foi forçada, mas também pelo brilhantismo com que representou Portugal nos diferentes países por onde passou.

A vida pública de Juliana começou em 1805 enquanto embaixatriz de Portugal na corte dos Reis Católicos de Espanha, quando acompanhava o marido, conde de Ega, com quem tinha casado em 1800 por imposição da sua mãe. Foi na corte espanhola que conheceu o barão Stroganoff, cujo trato delicado e galanteria se tornaram, para ela, inesquecíveis.

Regressados a uma Lisboa ocupada pelas tropas de Napoleão, o conde de Ega foi nomeado Ministro da Justiça pelo General Jean-Andoche Junot. Tornou-se, aí, público que a formosura da condessa da Ega tinha captivado o General. Quando um jornal Inglês insinuou a existência de uma ligação amorosa entre os dois, Juliana ficou publicamente conhecida como amante do primeiro ajudante de Napoleão, uma situação que motivou a irmã Frederica a escrever à mãe, exilada em Inglaterra, afirmando que “… tudo o que se tem dito de Juliana não passam de mentiras absurdas”.

Quando os franceses saíram de Portugal em 1808, Juliana viu-se forçada ao exilio em França, juntamente com toda a família do conde da Ega. Em Paris era grande o desencanto de Juliana e sombrias as suas perspectivas.

Nessa cidade foi acolhida, na dupla condição de exilada e de pessoa amável, por Laura Junot. Laura apresentou-lhe a pessoas amigas e aos russos que viviam em Paris e pôs à sua disposição os seus cavalos e sua casa, vindo posteriormente a afirmar nas suas memórias: “Quis provar que a maledicência e o falatório do mundo não tinham para mim qualquer valor”

No dia 28 de Março de 1809, o barão Stroganoff chegou a Paris e os dois reencontraram-se no Salon des étrangeres, onde tiveram oportunidade de falar sobre a sua estadia na corte Espanhola e sobre as suas viagens.

Juliana adoeceu depois deste reencontro e, com o pretexto da sua cura, a condessa e o barão Stroganoff foram, a 24 de Junho de 1809, para as termas de Aix-la-chapelle, de onde só regressaram no final de Agosto. Quando o barão partiu, de seguida, para São Petersburgo, deixou Juliana envolta em melancolia e a sentir-se como uma estranha na sua própria casa.

A partir desse momento, Juliana começou uma luta corajosa para se libertar de constrangimentos sociais e familiares, vencer a adversidade e conquistar a sua independência e felicidade, sempre apoiada por aquele que, quase 20 anos depois (em 1827), se tornou o seu segundo marido Grigory Alexandrovich Stroganoff, passando a ficar conhecida como Julia Stroganova.



O RELÓGIO

O relógio de bolso “Juliene” encontra-se envolvido numa “aura” de mistério, da qual só se poderá levantar um pouco o véu se recuarmos à época em que a relojoaria Francesa atingiu o seu incontestável prestígio — em que os seus relógios de bolso se tornaram símbolo de luxo requintado e à prova de modas efémeras — e na certeza de que quem o encomendou terá sido uma pessoa cosmopolita, culta, de grande sentido patriótico e profundamente apaixonada.

O retrato e as inscrições no seu mostrador conferem a este relógio de bolso, além do poder de contar um pouco da história do Tempo, a capacidade de desvendar pormenores da história de vida de quem o encomendou, numa época em que nos relógios franceses predominavam os temas idealizados sobre o amor.

Diversos são os detalhes que nos induzem a crer que o relógio tenha sido uma encomenda da própria Juliana Oberhausen, a começar pelas inscrições “Juliena” e “A Paris”, e pelo calendário em português. Os dias da semana em português podem ser indicativos do orgulho que tinha na sua Pátria, da qual foi embaixadora e onde tentava ver reabilitado o seu “bom nome”, injustamente enxovalhado, injuriado e caluniado. Este orgulho pela Pátria esteve sempre presente na sua identidade cosmopolita e nas interacções que partilhou com grandes figuras da Europa de então.

Certo é que nos relógios de finais do séc. XVIII início do séc. XIX, à figura retratada era atribuído o poder de um registo passado ou a lembrança da brevidade da vida. Para Juliana, o “retrato” assumia uma importância próxima de uma presença física, tendo expressado esta importância na carta que escreveu à sua irmã Francisca a partir do navio inglês “Chilton”, onde se encontrava já embarcada e antes de partir para o seu incerto destino: “Adeus, minha irmã da minha alma, muita falta me faz o seu retrato, recebi o das manas, agradeça-o outra vez à tia.”




A HIPÓTESE


O relógio terá sido ofertado a Grigory Alexandrovich Stroganoff, por quem nutria um grande amor. Este amor confessou-o numa extensa carta dirigida à sua mãe em 1814, consciente de que a sua vida já não teria futuro sem ele: “… já não está nas minhas forças renegar a vocação que circunstâncias imperiosas, e o meu coração agradecido me fizeram sentir: dedicar a minha vida àquele que nela encontrou felicidade. … a minha vida ficou mais perfeita desde que nela habita este sentimento imorredouro que aqui lhe declaro sem disfarces.”

Fica por esclarecer o significado da inscrição “FILA” e a dúvida de quando o relógio terá sido ofertado por Juliana, condessa de Ega, ao barão Stroganoff: se terá sido na sua partida de Paris para São Petersburgo, no ano de 1809, ou se no verão de 1823 quando a deixou no Château de Ris perto de Paris, para ir visitar a esposa que se encontrava doente em Dresden.



Bibliografia:

NORTON, José (2012) Juliana - Condessa de Stroganoff, Filha da marquesa de Alorna: A vida da portuguesa mais influente da Europa no Século XIX. Lisboa: Livros d'Hoje.

MARINHO, Lúcia Maria Rodrigues (2010) Guardiães do Tempo: A Arte da Relojoaria na Colecção da Casa-Museu Dr. Anastácio Gonçalves. Lisboa: Instituto de História de Arte da Faculdade de Letras da Universidade Clássica de Lisboa. "



"CENAS" DOS PRÓXIMOS EPISÓDIOS


O IPR contactou o José Norton, o autor do livro, que nos enviou uma resposta muito simpática indicando que Juliana viveu em Paris de 1808 a 1810 e de 1820 a 1823. O que poderá ser uma pista para a idade do relógio, há ainda porém muito por descobrir. Neste momento não é possível abrir o relógio para saber mais acerca do seu autor. Vamos manter a investigação e assim que tivermos novidades publicamos um novo artigo. Para acompanhar esta investigação subscreva o Boletim do IPR, no rodapé desta página.



Página de José Norton sobre Juliana


Apresentação do Livro Juliana Condessa Stroganof na RTP2


Blogue do autor José Norton

http://desunastidade.blogspot.com

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1 Comment

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Unknown member
Apr 04, 2021

Muito interessante. Ainda há histórias românticas por descobrir :)

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